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ILHA DO SOL

FICHA TÉCNICA

Direção, Roteiro e Montagem: Rodrigo Lima e Lucas Parente

Direção de Produção: Fernanda Romero e Jura Capela

Produção Executiva: Rodrigo Lima e Lucas Parente

Fotografia: Pablo Hoffmann

Direção de Arte: Moa Batsow e Walter Reis

Figurino: Carla Ferraz e Verônica Carvalho

Trilha Sonora: Guilherme Vaz

Mixagem e Edição de Som: Damião Lopes

 Som Direto: Uerlem Queiroz e Pedro de Assumpção

Elenco: Walter Reis

Produtora: Filmes Soledade e Besta Fera Filmes

Co-produção: Jura Filmes e TB Produções


FESTIVAIS


Curta Cinema (2021)

24ª Mostra de Cinema de Tiradentes  (2021)

27th Ji.hlava International Documentary Film Festival (2021)

PEQUENA FORTUNA CRÍTICA

Fragmento do texto da MOSTRA PANORAMA, Sessão 1, Catálogo da 24ª Mostra Tiradentes

por Roberta Mathias e Jorge Cruz

Seguindo um caminho de continuidade, “Ilha do Sol” é um exercício de futurologia, que bebe na fonte do caos crescente e avassalador do curta-metragem anterior. Lucas Parente, Rodrigo Lima e Walter Reis mostram um homem pintando símbolos ancestrais em uma pedra diante da Baía de Guanabara.

Walter carrega consigo muita expressividade, seu corpo enquanto objeto faz dessa performance mais do que uma distopia sobre o retorno das almas injustiçadas. É interessante imaginar o filme enquanto possibilidade daquela espécie que vivia aqui na época do coronavírus se extinguir, se pulverizar e outra – parecida na forma – surgir. Encontrando o que já aqui passou, fazer uma leitura muito mais digna e respeitar os povos originários. A obra surge quase como um convite ao respeito, usando a terra batizada por Luz del Fuego como cenário. 

 

Por sinal, imaginarmos ela como referência de alguns movimentos de Walter é adicionar muito mais camadas ao que se coloca na tela. Teria sido Dora Vivacqua a primeira de uma nova espécie? Esperamos que sim e que, de certa forma, ela ressurja em corpos como a do protagonista de “Ilha do Sol” para apresentar o seu legado.

IILHA DO SOL

por Rayanne Cândido

Meticulosamente uma realidade primitiva é traçada em uma ilha. Ilha do Sol, curta de Lucas Parente e Rodrigo Lima se desenvolve em uma Baía de Guanabara silenciosa e decrépita, em que o instinto humano e o primitivismo são explorados.

 

A Ilha do Sol se mostra habitada por um único homem, a única referência de humanidade que o telespectador recebe para se identificar. A cada detalhe do grafismo que se completa, maiores são as inúmeras tentativas de compreender o que acontece diante aos olhos.

Cada ato e expressão subjetiva são o suficiente para interpretação. Se de um lado surge a inquietação pelo distanciamento de um contexto mais movimentado e populoso, de outro, a sensação de alívio por não existir situações conflitantes quebradoras do ritmo apresentado.

O símbolo que se forma quando a criação chega ao fim é marcante, e até para quem não compreende a referência, fica explícito que há algo significativo ali. A dedicatória para Luz del fuego é o grande direcionador conclusivo.

Para além do que é mostrado em tela, existe uma lacuna aberta na alma de São Gonçalo, município em que a Ilha do Sol é localizada. Às margens da praia da Luz, a artista Luz del Fuego foi assassinada. Era conhecida por suas apresentações sensuais em quais dançava com serpentes amestradas, uma representação musical singular para a época em que viveu.

Um pouco antes da sua morte, havia comprado a pequena ilha e inaugurado um resort naturista, cenário de nudismo em meio à natureza caiçara. O escândalo foi tanto que se seguiu à tragédia. Dentre todos os significados e sentimentos que o curta aborda, a violência esquecida e o corpo como resistência é o maior deles. Ilha do Sol é um convite à uma experiência de reflexão interna como seres que somos e externa como sociedade.

Trecho de TIRADENTES: "AÇUCENA", "VAGALUMES" e "ILHA DO SOL"

por Carlos Alberto Mattos

Ilha do Sol é dedicado a Luz del Fuego, a dançarina que criou naquele lugar o primeiro reduto naturista no Brasil. No curta assinado por Lucas Parente, Rodrigo Lima e Walter Reis, a ilha é cenário de outro tipo de performance. Um homem (Walter Reis) desenha sobre uma pedra uma figura composta de sol e serpente (signo este que também remete a Luz del Fuego). De vez em quando, posa para a câmera em esgares primitivos. O ritual se conclui com uma imagem que parte da ilha e se expande até enquadrar todo o planeta no espaço, acompanhada de um texto-lamento em idioma indígena.

O caráter experimental do filme dispensa interpretação além de sabermos pela sinopse que se trata de um grafismo ameríndio. A ausência de referências míticas à Ilha do Sol faz crer que ela foi escolhida apenas por sua localização exótica e próxima a municípios degradados como São Gonçalo e o próprio Rio de Janeiro. Fica o registro de uma obra de land art.

SINUOSIDADE FOTOGRÁFICA
Entrevista com Pablo Hoffmann

por Júlia Aguiar

O filósofo Vilém Flusser escreve em “Filosofia da Caixa-Preta”, que o poder da imagem é justamente fruto da possibilidade mágica de hipnotização do telespectador, “as imagens são resultado do esforço de se abstrair duas das quatro dimensões espácio-temporais, para que se conservem apenas as dimensões do plano”, escreve Flusser. É curioso perceber em obras cinematográficas o poder e a densidade comunicativa que se cria através da sensibilidade desse fazer cinema independente no contexto atual. 


Na era da contrainformação, é como um suspiro se deixar atravessar por obras sinuosas, brasileiras, enraizadas na construção de suas próprias narrativas. O curta-metragem “Ilha do Sol”, dirigido por Lucas Parente, Rodrigo Lima e Walter Reis é uma surra de simbologias herméticas capturadas com o olhar de Pablo Hoffmann. 


Disponível na 24º Mostra de Cinema de Tiradentes, o curta é fruto de um outro filme: “Calipso”. A performance de Walter Reis na ilha do sol, localizada na baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, foi gravada durante o processo do filme “Calipso” – que contava com a mesma equipe do curta – e como não entrou na montagem do longa, se tornou um filme próprio. 


A performance visceral de Walter, gravada em contraluz pelo diretor de fotografia Pablo Hoffmann, pode ser descrita como uma quebra na linguagem fotográfica, usando do acaso a sensibilidade para captar uma história intensa e comovente. Em entrevista para o Jornal Metamorfose, Pablo conta que a ideia de “Calipso” era gravar um filme com somente o uso do sol como iluminação, realçando as sombras e texturas na imagem. “Para deixar as figuras mais escuras que a gente conseguisse, não usamos nenhum tipo de rebatedor ou outra luz, e a gente fez um mapa da ilha e algumas visitas antes de filmar, tiramos fotos dos pontos que achamos mais interessantes e nos planejamos para estar nesses lugares em contraluz”, relata ao JM. 


Assim como “Calipso”, o curta “Ilha do Sol” busca ressaltar o mistério, as profundezas do abismo interno, o desconhecido. Com uma fotografia que abusa da metáfora do mar como palco e personagem do explorar o inimaginável, “durante as filmagens a gente tinha o mar como uma barreira fixa que impedia os personagens de sair da ilha, então ele sempre foi uma vasta imensidão que os prendia. E na própria ilha a gente lidava com as texturas daquelas pedras, do mar, do contraste com o sol”, explica Pablo. 


Já a locação dos dois filmes tem uma história pra lá de simbólica tendo em vista o momento distópico que vivemos, algo que mesmo não sendo explícito, fica claro em “Ilha do Sol”. A ilha foi batizada com o nome que carrega o curta em 1940 pela artista Luz del Fuego, uma das vedetes mais importantes do Brasil. Nesse período ela se isolou na ilha e começou a expor os seus ideais existencialistas, naturistas, em defesa dos direitos da mulher e da liberdade de expressão, e em combate aos preconceitos sociais.


Sendo uma figura histórica na cidade do Rio de Janeiro, sua trajetória está de certa forma marcada nas pedras e texturas presentes em “Ilha do Sol”. Em um filme que explora o misticismo do delírio tatuado em uma cobra desenhada pelo Walter Reis na superfície de uma grande rocha, segundo Hoffmann: “Nossa abordagem era com planos fixos durante o filme, então acabamos fazendo a mesma ideia no curta. O pincel dele tinha sempre pouca tinta, então ele tinha que voltar no pote de tinta e fazer mais um pequeno traço e cada saída e volta dele eu apostava num dado enquadramento e deixava que o corpo de Walter fizesse as composições, com um pouco de caos dentro da preparação que a gente teve”. 


Assim como a teoria filosófica da fotografia abraçada por Flusser, “Ilha do Sol” brinca com a profundidade do capturar fotográfico. A potência semiótica nas simbologias angariadas entre o corpo semi nu de Reis e a imensidão escura do mar que banha a bahia de Guanabara, os reflexos oportunos do sol em cada linha traçada ritualisticamente, é como se tudo fosse uma produção do acaso. 


“A sorte, a chance, o acaso e o caos trouxeram coisas interessantes pra gente, que foram levadas na montagem do filme. Eu consegui estar de uma forma bem livre e apostar em um quadro que ia acontecer alguma coisa interessante, gerando uma sombra, uma postura de corpo, uma composição... e tudo teve um significado depois na montagem”, explica o diretor de fotografia Pablo Hoffmann em entrevista ao JM. Porém, há de se lembrar que o cinema é sobretudo, uma arte coletiva. O que transforma “Ilha do Sol” em um dos filmes mais belos da 24º Mostra de Cinema de Tiradentes é sua composição coltiva, construída de forma tão sutil pelo acaso do agora. 


Para o diretor de fotografia, abraçar o caos do presente é se permitir estar aberto no momento de filmagem. Ao buscar saber o máximo daquele filme: a abordagem que o diretor tem sobre aquele tema, como ele olha aquele filme, aquela cena, se preparando com o aparato técnico que você tem, para que no momento do “vamo-vê” você possa ser levado pela magica do momento. 


“Sabe aquela fagulha que vai encandecer e queimar e se extinguir em pequeno momento de tempo? Tudo isso para deixar o caos entrar, o que não se prepara, o inesperado acontecer ali. Fazer corpo com o presente, é uma forma de meditação. É o mistério da criação, ninguém sabe, vai acontecer da forma que aquele grupo conseguir evocar os santos e bater os tambores e fazer acontecer na frente da câmara. É o próprio filme que decide se vai acontecer ou não, ele vai pedindo as coisas, vai te contando como ele quer ser filmado”, finaliza Pablo. 

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